Trabalho Escravo | MPT pede a justiça determine o resgate de 114 trabalhadores de casas de farinha​

Na manhã desta quarta-feira (29), o Ministério Público do Trabalho (MPT) em Pernambuco ingressou com ação civil pública na justiça, pedindo o resgate de 114 trabalhadores encontrados em situação análoga a de escravo em casas de farinha no Sertão do Estado. O pedido é feito em caráter liminar, sendo réus na ação três empregadores e a União. A medida decorre de fiscalização realizada pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel, na semana passada, em Ipubi e Araripina.

No entendimento do procurador do Trabalho, vice-coordenador da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete) do MPT, Ulisses Carvalho, presente na fiscalização, a situação dos trabalhadores contempla todos os requisitos legais para o resgate. De acordo com ele, foram fiscalizadas diversas casas de farinha situadas no distrito de Serrolândia, município de Ipubi. Na imensa maioria, “o cenário encontrado era absolutamente estarrecedor”, segundo ele. Em três delas, a situação foi mais séria, com a submissão a condições degradantes de trabalho, sem qualquer respeito aos direitos fundamentais, às regras de saúde e segurança do trabalho, sem falar na utilização intensiva de mão de obra infantil.

O MPT pede que a justiça determine que a União, por meio dos auditores fiscais do Trabalho, realize o resgate dos 114 trabalhadores, devendo a Assistência Social do município acompanhar. Deverá ainda conceder o pagamento de três parcelas de seguro-desemprego, no valor de um salário mínimo a cada uma das vítimas enumeradas, assim como encaminhá-las para o sistema de qualificação profissional e recolocação no mercado de trabalho, por meio do Sistema Nacional de Emprego (Sine), conforme determina a legislação.

“Esse é um pedido que fazemos ainda em caráter de urgência. Como as unidades estão interditadas pela Subsecretaria do Trabalho, porque não têm condição de funcionar, a atividade de subsistência dos 114 trabalhadores ficou comprometida”, disse o procurador na ação.

Os estabelecimentos eram destinados à produção de farinha de mandioca, por meio do processo de descascamento, corte, moagem ou trituração, cozimento, secagem e ensacamento do produto final, que é vendido por meio de intermediários, sem registro fiscal, em sacas de 50 quilos.

Compuseram o Grupo Móvel, além do MPT, a Defensoria Pública da União, Ministério da Economia/ Inspeção do Trabalho e Polícia Militar do Estado de Pernambuco.


Trabalho infantil

A ação não só contempla pedidos para os trabalhadores adultos. O MPT também pede providências com relação ao trabalho precoce encontrado nas unidades fabris. “As três unidades acionadas nesta ação civil usavam mão de obra infantil no seu processo produtivo. Na última segunda, dia 27, foram firmados termo de ajuste de conduta com cada uma delas, sendo assumidas as obrigações de afastar definitivamente de qualquer atividade laboral os 13 menores de idade encontrados em situação de trabalho proibido”, disse Ulisses. 

Pelos TACs firmados, as unidades também se comprometeram a proceder aos cálculos e pagar todas as verbas trabalhistas salariais e rescisórias devidas e indenização a título de danos morais individuais para compensar a submissão ao trabalho precoce em atividade proibida.

Mesmo com a assinatura do TAC, o MPT pediu na ação a condenação dos réus, exceto da União, na obrigação de proibi-los de admitir empregados menores de dezoito anos em trabalho noturno, perigoso ou insalubre, e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos, e de não permitir nos estabelecimentos o trabalho precoce em quaisquer das atividades previstas na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP).

 


Dano Moral Coletivo

O MPT também pediu ao judiciário a condenação das unidades fabris ao pagamento de dano moral coletivo. De acordo com o procurador, a gravidade das irregularidades constatadas, seja pela submissão de 114 trabalhadores a condições degradantes de trabalho, seja pelo uso deliberado de mão de obra infantil, pedem a providência. “Em um dos estabelecimentos, identificamos que a mão de obra infantil correspondia a 23% da força de trabalho da casa de farinha”, disse.
O cálculo do valor pedido pelo dano leva em consideração o contexto socioeconômico e os valores de faturamento média de quatro semanas de produção dos três estabelecimentos fiscalizados, um montante de R$ 391.200,00 (trezentos e noventa e um mil e duzentos reais).

O MPT pediu ao judiciário que as unidades fabris sejam condenadas a pagar, de forma solidária, indenização pelo dano moral causado à coletividade em valor não inferior a R$ 1.270.000,00, o que corresponde a dez mil reais por trabalhador adulto submetido às condições degradantes impostas pelos demandados e vinte mil reais por cada um dos 13 menores de idade submetidos a tais condições de trabalho.

A indenização deverá ser destinada, na medida do possível, à recomposição dos bens coletivos lesados, de forma a viabilizar a promoção de atos ou de políticas públicas que promovam a dignidade do trabalho no Estado de Pernambuco.

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