Artigo | Procuradora faz análise sobre um ano da reforma trabalhista
Texto de Vanessa Patriota, publicado no último dia 5 de novembro, no Correio Braziliense, apresenta um balanço da nova lei
Balanço da Reforma Trabalhista
A preocupação com regulação do trabalho é um tema permanente e essencial nas sociedades modernas. A tese de que seria necessário flexibilizar a legislação trabalhista não é nova. Seus contumazes defensores argumentam que a CLT seria rígida e arcaica. A "modernização" seria imperativa para viabilizar o desenvolvimento econômico partindo da discutível premissa de que geraria mais empregos só porque ficou mais barato contratar.
Nesse contexto, foi aprovada a Reforma Trabalhista - Lei nº 13.467/2017. Promovendo preocupantes mudanças na legislação ordinária, a Reforma afeta e aflige todos os brasileiros que ganham a vida com o próprio trabalho. Essas preocupações, embora seja difícil estabelecer a precisa relação de causa e efeito, não passaram despercebidas no último pleito eleitoral, já que os principais defensores da Reforma não tiveram sucesso na renovação dos mandatos.
No aspecto jurídico formal, a Reforma é um dado. Vigora desde 11/11/2017. É certo que há questões pendentes de apreciação pelo Judiciário quanto a sua adequação às normas jurídicas de posição hierárquica superior, internas e internacionais. Mas importa pouco, agora, na perspectiva pragmática, rediscutir os atropelos do processo legislativo, a precariedade do texto e a debilidade dos argumentos que justificaram várias das inovações legislativas.
Passado um ano de sua vigência, impõe-se o estudo e a avaliação dos resultados já conhecidos. Pesquisadores do mundo do trabalho (economia, previdência, direito, sociologia, política e economia do trabalho) vêm se dedicando à questão. Em março de 2018 foi criada a Remir Trabalho - Rede de Estudos e Monitoramento Interdisciplinar da Reforma Trabalhista, que conta com a participação das mais importantes universidades e centros de estudos nacionais, e realiza a coleta e análise de dados desse rico campo de estudo.
A sociedade e o Estado brasileiro têm muito a aprender com os dados e com os números da guinada legislativa no nosso modelo de regulação do trabalho. É fundamental entender os efeitos da Reforma nas relações de trabalho e no modo de organizar os fatores de produção, inclusive procurando antecipar os cenários e os desdobramentos futuros.A análise técnica desses dados permitirá, mais do que apontar erros e acertos da alteração legislativa, escrutinar se os objetivos foram atingidos e se a sociedade adotou um rumo seguro, apontando eventuais ajustes na rota. Possibilitará, ainda, a orientação do Estado brasileiro na implementação de políticas públicas e na elaboração de atos normativos, se for o caso, que promovam a convergência entre os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, que são, com a dignidade da pessoa humana, fundamentos constitucionais da República Federativa do Brasil.
Ao estabelecer que a nossa ordem social tem como base o primado do trabalho, com um rol de direitos mínimos a que devem ser agregadas medidas que visem à melhoria de sua condição social, a Constituição não deixa dúvidas sobre o sentido da modulação normativa permitida. A precarização das condições de labor e o aviltamento do trabalhador, logicamente, não devem ser considerados resultados compatíveis com o comando constitucional. A rede de proteção trabalhista, aí compreendidos o Ministério Público do Trabalho, a Justiça do Trabalho, a Auditoria Fiscal do Trabalho e as entidades sindicais tem nesse comando um vetor seguro de atuação.
Já são conhecidos dados esparsos dos primeiros meses da experiência, especialmente no tocante ao número e à qualidade dos postos de trabalho gerados. O balanço e a análise qualificada desse primeiro ano são relevantes para a aferição, na linha do tempo, do comportamento do mercado de trabalho e de suas imbricações com a economia. O estudo também precisa ser feito à luz das experiências de outros países que passaram por iniciativas semelhantes.
Dados como esses serão apresentados em Brasília por reconhecidos economistas, sociólogos e juristas no seminário "Um Ano de Vigência da Reforma Trabalhista: Efeitos e Perspectivas"; nos dias 12 e 13.11.2018, organizado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Remir Trabalho, com inscrições gratuitas pelo site do MPT (mpt.mp.br), em evento aberto ao público em geral.
A regulação do trabalho, tema crucial e em permanente construção, também na sociedade brasileira que se pretende moderna e civilizada, tem no evento uma singular oportunidade de avaliação e indicação de aprimoramentos.
Vanessa Patriota da Fonseca Leomar Daroncho é procuradora do MPT em Pernambuco.