Fórum de combate aos agrotóxicos e transgênicos divulga nota contra CTNBio

O Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos divulgou nesta quarta-feira (8) nota de repúdio à atuação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio. O documento refere-se à aprovação dos organismos geneticamente modificados (OGMs) pela comissão e critica o órgão por “descumprimento à Política Nacional de Biossegurança”.

A nota do Fórum corrobora com o relatório divulgado, também na quarta, pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca), que indica que o Brasil é o campeão mundial no uso de agrotóxicos e que alerta para os riscos do uso desse tipo de produto. O país despeja mais de um milhão de toneladas desses produtos em suas lavouras por ano, uma média de cinco quilos por habitante. O que demonstra também o baixo consumo de alimentos orgânicos.

Confira a nota na íntegra:

NOTA DE REPÚDIO

 Brasília - 2015

 O FÓRUM NACIONAL DE COMBATE AOS IMPACTOS DOS AGROTÓXICOS E TRANSGÊNICOS, instrumento de controle social que congrega entidades da sociedade civil com atuação em âmbito nacional, órgãos de governo, o Ministério Público e representantes do setor acadêmico e científico, com sede na Procuradoria Geral do Trabalho, Anexo I, situado na SAS, Quadra 04, Bloco L, Brasília-DF, tendo em vista os 10 (dez) anos de promulgação da Lei nº 11.105/2005, vem a público manifestar seu REPÚDIO à atuação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, em descumprimento à Política Nacional de Biossegurança, no que se refere à aprovação dos organismos geneticamente modificados (OGMs),

1. CONSIDERANDO que a normatização e a fiscalização das entidades responsáveis pela pesquisa e comércio de OGMs são obrigações do Poder Público e da coletividade, nos termos dos incisos II e V, do §1º, do artigo 225, da Constituição Federal, intrinsecamente ligadas aos direitos fundamentais à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado;

2. CONSIDERANDO que a concretização dessas obrigações, ao longo dos anos, tem sofrido a influência de outros interesses, opostos aos que deveria proteger, demonstrando pouca atenção do Governo com a efetivação desses direitos, além de um histórico de legislações e atos administrativos de constitucionalidade e legalidade duvidosas;

3. CONSIDERANDO que a CTNBio foi originalmente concebida como órgão consultivo e de assessoramento técnico, destacando-se que suas normas e pareceres deveriam ter como referência a proteção da saúde humana, dos organismos vivos e do meio ambiente, de acordo com o artigo 1º-A da Lei nº 8.974/1995;

4. CONSIDERANDO, também, que após diversos embates políticos e jurídicos, foi promulgada a Lei nº 11.105/2005, que relativou as atribuições da CTNBio quanto à proteção dos bens jurídicos “saúde humana” e “meio ambiente”;

5. CONSIDERANDO que não obstante os artigos 6º, inciso VI, 10, 14, incisos IV, VIII e XX e §§ 1º a 6º, 16, §1º, inciso III, e §§2º a 7º, 37 e 39, da Lei nº11.105/05, não é o órgão o único responsável pela autorização de pesquisa, comércio e importação de organismos geneticamente modificados e seus derivados em território nacional, tendo em vista o artigo 23, inciso VI, da Constituição Federal;

6. CONSIDERANDO que tramita no Supremo Tribunal Federal a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.526, a respeito da exclusividade da CTNBio bem como a dispensa de estudo prévio de impacto ambiental para a liberação de OGMs, conclusa ao Ministro Relator desde 21/10/2009;

7. CONSIDERANDO que o processo de escolha dos representantes e o quórum de deliberação, incentivaram a CTNBio a flexibilizar regras e a proferir, sem restrições, registros de OGMs, tanto que a Comissão nunca deixou de deferir um pedido autorizativo;

8. CONSIDERANDO, ainda, que o quórum para liberação comercial de OGMs, antes 2/3 (dois terços), foi reduzido em 2007 para maioria simples, nos termos da Medida Provisória nº 327, convertida na Lei nº 11.460;

9. CONSIDERANDO que existem duas categorias de interesses na composição da CTNBio, uma formada por representantes da sociedade civil e por entidades comprometidas com a proteção da saúde pública e do meio ambiente, e outra ligada aos setores agrícolas, comerciais, industriais e à própria criação dos transgênicos;

10. CONSIDERANDO, também, que não há paridade entre esses interesses, causando um desequilíbrio nas deliberações da comissão em desfavor dos interesses sociais. A representação dos que defendem exclusivamente a saúde, o meio ambiente é apenas para compor o quorum, sem qualquer poder de realmente exercer as suas faculdades;

11. CONSIDERANDO que foi aumentada a hipótese de sigilo de forma ilegal (alteração regimental, ocorrida em junho de 2011 por meio da Portaria MCT nº 373), restringindo a participação da coletividade e o acesso à informação em procedimentos administrativos, prevista no artigo 14, inciso XIX, da Lei 11.105/2005;

12. CONSIDERANDO que houve a recusa ao pedido do GT Intercameral Transgênicos e Agrotóxicos, da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, de realização de audiência pública para debate de OGMs tolerantes ao herbicida 2,4-D, um dos componentes do “agente laranja”, utilizado na Guerra do Vietnã;

13. CONSIDERANDO, também, que o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, a quem cabe avocar e decidir, em última instância, os processos relativos a atividades que envolvam o uso comercial de OGMs e seus derivados (conforme artigo 8º, §1º, inciso III, da Lei de Biossegurança), se abstém de exercer essa função;

14. CONSIDERANDO, principalmente, que nos processos de liberação do milho transgênico das empresas Bayer e Monsanto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Minerais Renováveis – IBAMA, apresentaram recursos em razão de erros técnicos contidos nos pareceres da CTNBio, os quais foram julgados improcedentes pelo CNBS, baseando-se em um parecer jurídico da Advocacia-Geral da União, por entender que a competência da CTNBio é exclusiva e suas decisões possuem caráter vinculante;

15. CONSIDERANDO, finalmente, que a função regulamentadora também sofre de omissão e ineficiência, tendo em vista que a CTNBio desqualifica trabalhos científicos que destacam que diversas lavouras que respeitavam as distâncias mínimas regulamentadas (Resolução Normativa nº 4, de 16 de agosto de 2007) foram contaminadas por Organismos Geneticamente Modificados. Ao invés de analisar eventuais falhas técnicas, desconstruiu o trabalho da SEAB, afastando a fiscalização dos órgãos ambientais do Estado do Paraná, sob o fundamento de ser atribuição do Ministério da Pecuária e Abastecimento – MAPA;

O Fórum Nacional, através de sua Coordenação, CONCLUI que todas essas circunstâncias demonstram o retrocesso da Política Nacional de Biossegurança, marcada pela atuação da CTNBio, que passou a levar em consideração, quiçá defender, interesses opostos aos que deveria.

Assim, ante o abandono, por parte da CTNBio, dos paradigmas de proteção à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com evidência de descumprimento dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção, inclusive das disposições contidas na legislação acima mencionada, o Fórum vem repudiar tais comportamentos, lamentar o processo da Biossegurança no Brasil, nesses 10 (dez) anos da Lei nº 11.105/2005 e remeter cópia da presente NOTA DE REPÚDIO à Quarta Câmara da Procuradoria Geral da República, para as aprovidências que o caso exigir.

 

PEDRO LUIZ GONÇALVES SERAFIM DA SILVA

Coord. do Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos

MARCIANO TOLEDO DA SILVA

Secretário Executivo      

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